A PF (Polícia Federal) encontrou na casa do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF Anderson Torres uma minuta para o então presidente Jair Bolsonaro (PL) decretar Estado de Defesa na sede do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), em Brasília.
O objetivo do documento seria mudar o resultado da eleição. O ex-presidente perdeu o pleito para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em seu perfil no Twitter, Torres disse que havia em sua residência uma “pilha de documentos para descarte” e que “muito provavelmente” a minuta estaria ali. “Tudo seria levado para ser triturado oportunamente no MJSP [Ministério da Justiça e Segurança Pública]. O citado documento foi apanhado quando eu não estava lá”, declarou.
O ex-ministro também disse que a minuta encontrada foi vazada “fora de contexto”, o que teria ajudado a “alimentar narrativas falaciosas” contra ele.
“Fomos o primeiro ministério a entregar os relatórios de gestão para a transição. Respeito a democracia brasileira. Tenho minha consciência tranquila quanto à minha atuação como Ministro”, declarou.
Conforme a Constituição, o presidente da República pode, depois de ouvir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar Estado de Defesa para “preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza”.
Torres teve a prisão preventiva decretada pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Alexandre de Moraes, na 3ª feira (10.jan). A determinação respondeu à representação apresentada pelo diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues. Torres mora em Brasília, no bairro Jardim Botânico. Os agentes saíram do local com um pacote, colocado no carro da corporação.
A PGR (Procuradoria Geral da República) enviou ao STF um pedido de abertura de inquérito contra Torres e o governador afastado do DF, Ibaneis Rocha (MDB), na 3ª feira (10.jan).
Torres é acusado pelas autoridades de ser omisso sobre os atos envolvendo vandalismo e invasões às sedes dos Três Poderes da República em Brasília no 8 de Janeiro.
Ele foi demitido da Secretaria de Segurança Pública do DF por ordem do governador, agora afastado, Ibaneis Rocha, no mesmo dia em que os extremistas invadiram o Congresso, o Planalto e o STF.
Torres assumiu o cargo depois de chefiar o Ministério da Justiça e Segurança Pública em 2021 e 2022 no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
TRANSCRIÇÃO
Leia a seguir a transcrição da minuta de decreto que baixava Estado de Defesa na Justiça Eleitoral e que permitia revisar resultado da eleição:
“O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso de suas atribuições que lhe conferem os artigos 84, inciso IX, 136, 140 e 141 da Constituição,
“DECRETA:
“Art. 1° Fica decretado, com fundamento nos arts. 136, 140, 141 e 84, inciso IX, da Constituição Federal, o Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, Distrito Federal, com o objetivo de garantir a preservação ou o pronto restabelecimento da lisura e correção do processo eleitoral presidencial do ano de 2022, no que pertine à sua conformidade e legalidade, as quais, uma vez descumpridas ou não observadas, representam grave ameaça à ordem pública e a paz social.
- 1°. Fica estipulado o prazo de 30 (trinta) dias para cumprimento da ordem estabelecida no caput, a partir da data de publicação deste Decreto, podendo ser prorrogado uma única vez, por igual período.
- 2°. Entende-se como sede do Tribunal Superior Eleitoral todas as dependências onde houve tramitação de documentos, petições e decisões acerca do processo eleitoral presidencial de 2022, bem como o tratamento de dados telemáticos específicos de registro, contabilização e apuração dos votos coletados por urnas eletrônicas em todas as zonas e seções disponibilizadas em território nacional e no exterior.
- 3°. Verificada a existência de indícios materiais que interfiram no objetivo previsto no caput do art. 1° a medida poderá ser estendida às sedes dos Tribunais Regionais Eleitorais.
“Art. 2° Na vigência do Estado de Defesa ficam suspensos os seguintes direitos:
“I – sigilo de correspondência e de comunicação telemática e telefônica dos membros do Tribunal do Superior Eleitoral, durante o período que compreende o processo eleitoral até a diplomação do presidente e vice-presidente eleitos, ocorrida no dia 12.12.2022.
“II – de acesso às dependências do Tribunal Superior Eleitoral e demais unidades, em caso de necessidade, conforme previsão contida no §3º. do art. 1°.
- 1°. Durante o Estado de Defesa, o acesso às dependências do Tribunal Superior Eleitoral será regulamentado por ato do Presidente da Comissão de Regularidade Eleitoral, assim como a convocação de servidores públicos e colaboradores que possam contribuir com conhecimento técnico.
“Art. 3° Na vigência do Estado de Defesa:
“I – Qualquer decisão judicial direcionada a impedir ou retardar os trabalhos da Comissão de Regularidade Eleitoral terá seus efeitos suspensos até a finalização do prazo estipulado no §1°, art. 19,
“II – a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que poderá promover o relaxamento, em caso de comprovada ilegalidade, facultado ao preso o requerimento de exame de corpo de delito à autoridade policial competente;
“III – a comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação;
“IV – a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário;
“V – é vedada a incomunicabilidade do preso.
“Parágrafo único. O Presidente da Comissão de Regularidade Eleitoral constituir-se-á como executor da medida prevista no inciso I, do $3° do art. 136, da Constituição Federal.
“Art. 4º A apuração da conformidade e legalidade do processo eleitoral será conduzida pela Comissão de Regularidade Eleitoral a ser constituída após a publicação deste Decreto, que apresentará relatório final consolidado conclusivo acerca do objetivo previsto no caput do art. 19.
“Art. 5° A Comissão de Regularidade Eleitoral será composta por:
“I – 08 (oito) membros do Ministério da Defesa, incluindo a Presidência;
“II – 02 (dois) membros do Ministério Público Federal;
“III – 02 (dois) membros da Polícia Federal, ocupantes do cargo de Perito Criminal Federal;
“IV – 01 (um) membro do Senado Federal;
“V – 01(um) membro da Câmara dos Deputados;
“VI – 01(um) membro do Tribunal de Contas da União;
“VII – 01 (um) membro da Advocacia Geral da União; e,
“VIII – 01 (um) membro da Controladoria Geral da União.
“Parágrafo único. À exceção das autoridades constantes do inciso I, cuja indicação caberá ao Ministro da Defesa, as indicações dos membros dos órgãos e instituições que integrarão a Comissão de Regularidade Eleitoral deverão ser feitas em até 24 (vinte e quatro) horas após a publicação deste Decreto no Diário Oficial da União, devendo as designações serem formalizadas em ato do Presidente da Comissão de Regularidade Eleitoral.
“Art. 6°. Serão convidados a participar do processo de análise do objeto deste Decreto, quando da apresentação do relatório final consolidado, as seguintes entidades:
“I – 01 (um) Integrante da Ordem dos Advogados do Brasil
“II – 01 (um) representante da Organização das Nações Unidas no Brasil
“III – 01 (um) representante da Organização dos Estados Americanos no Brasil (Avaliar a pertinência da manutenção deste dispositivo na proposta)
“Art. 7º. O relatório consolidado final será apresentado ao Presidente da República e aos Presidentes do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, e deverá conter, obrigatoriamente:
“I – apresentação do objeto em apuração
“II – a metodologia utilizada nos trabalhos
“III – as contribuições técnicas recebidas
“IV – as eventuais manifestações dos membros componentes
“V – as medidas aplicadas durante o Estado de Defesa, com as devidas justificativas
“VI – o material probatório analisado
“VII – a relação nominal de eventuais envolvidos e os desvios de conduta ou atos criminosos verificados, de forma individualizada.
“Parágrafo único. A íntegra do relatório final consolidado será publicada no Diário Oficial da União.
“Art. 8° Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
“Brasília, de de 2022.
“201° ano da Independência
“134º ano da República
“Jair Messias Bolsonaro”